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sábado, 1 de junho de 2013

☑ A VÍTIMA DO MEDO, de Michael Powell

           Espreitando o medo dos outros: o medo do medo

"Peeping Tom"
UK (1960)
De Michael Powell, com Karlheim Bohm, Moira Shearer e Anna Massey.
Thriller. Drama psicológico e filosófico. 101 minutos. Cor.
Sinopse:
Um fotógrafo assassina mulheres, usando uma câmara para captar as suas expressões de terror ao morrer.

 
Um filme manifestamente avançado para a época em que surgiu e a recepção negativa de público e crítica, custaram ao prestigiado e até então "sério" realizador britânico o fim forçado da sua carreira e o exílio na Austrália.
Trata-se de um polémica reflexão sobre voyeurismo e violência, com referências muito remotas e "soft" ao sexo e que não obstante a incompreensão inicial, tornou-se num filme de culto e obra-prima das novas gerações, não seguramente pelo terror que veicula, que não é especialmente chocante para os "standards" actuais.
O filme sugere um paralelismo com o voyeurismo por excelência e socialmente aceite da experiência cinéfila, que neste filme é maximizado uma vez que nos tornamos duplamente cúmplices, num primeiro momento ao "desfrutar" do crime e posteriormente ao visualizá-lo pelos olhos do assassino na projeção, não se podendo menosprezar, ainda que aceitável e desculpável num contexto cinéfilo, o gozo pela dor e pelo medo infligidos nas vítimas.
Para além do mais, Powell, estabelendo uma relação de causalidade da situação psicótica do protagonista com os acontecimentos traumáticos da sua infância, consegue fazer do "serial killer"  Mark Lewis um ser humano simpático, sensivel e inteligente, produto da crueldade que lhe foi infligida na infância, bem diferente do estereótipo do assassino como em "Seven" ou "Silênco dos inocentes", só para citar dois exemplos notórios. E resultante desta empatia contranatura com o protagonita, Powell amplia e distorce o impulso voyeurista que há em todos nós, facto que é inovador no cinema contemporâneo e quase incompreensível à epoca em que foi concebido. 
Igualmente interessante é uma abordagem filosófica com base em conceitos de exploração e manipulação  da percepção,  retomados numa fase mais contemporânea entre outros  por  Michel Foucault, que defendem  a relação de causalidade entre o escrutínio e a punição.
Este filme desenquadra-se da época, sendo acusado na altura  de ser deprimente e falho de humor, como contraposto a Psycho,  mas na realidade trata-se de  uma desculpa esfarrapada, como se vai comprovando na cena da tabacaria  quando um idoso compra fotos de mulheres nuas, numa altura em que este tipo de produções era semi-clandestina no reino Unido e também nas cenas de realização do filme, que ocorre dentro de "Peeping Tom".
Comparado a Psycho (1960) é em certo sentido mais ousado que a obra prima de Hitchcok, nomeadamente na exploração da causalidade do estado psicótico, que é mais sólidamente defensável na sua lógica e  consequências  do que o primarismo Freudiano do filme Americano. 
O argumento é estimulante, desafiando a inteligência, capacidades perceptivas e a capacidade de filtrar as emoções do observador. 
Excelente cinematografia, com composições marcantes e imaginativas, associadas a um uso judicioso da cor, que  nos ficam na retina e de modo indelével marcadas na memória.

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