Música para o coração
De Satyajit Ray, com Chhabi Biswas, Sardar Akhtar, Gangapada Basu e Padmadevi.
Drama psicológico. Música. 100 minutos. Preto e branco.
Sinopse:
Biswambhar Roy é um aristocrata e o último do seu reino. Com o tempo, este outrora grande senhor feudal, foi perdendo dinheiro e poder até ficar à beira da ruína. Mas ele é orgulhoso e acha que deve manter o estilo de vida da sua linhagem. A ostentação é mais visível na maior e sumptuosa divisão do seu palácio: o salão de música. Ele contrata os mais reputados músicos e dançarinas e convida as pessoas mais importantes da região, para as suas "soirées". A sua mulher tenta controlar os gastos, mas a festa de iniciação religiosa do seu filho adolescente, acarreta a perda das últimas jóias da família. Atingido pela tragédia, ele manda encerrar o salão de música e entra em depressão e letargia, até que numa última "soirée", o resto da fortuna familiar será consumida...
Enquanto esperava por financiamento para completar a "trilogia de Apu", Ray teve ainda talento e meios para nos brindar com outra obra prima, que em termos de notoriedade é ofuscada por aquela, mas na realidade trata-se de um dos grandes filmes de sempre, não sendo por acaso que consta no vigésimo lugar na lista dos 100 melhores filmes de sempre do "Cahiers de cinema".
Este "salão de música", tem muito de pessoal ou não fossem as origens do realizador similares às da aristocrática personagem do filme. E isso nota-se na atenção que Ray concede aos ínfimos pormenores do cenário e da encenação.
A história de um velho aristocrata arruinado, perseguido por dolorosas recordações e consumido pela culpa do trágico fim dos seus únicos familiares, é retratada com a mesma serenidade espiritual e complexidade emocional e com idêntica riqueza gráfica, já aparente nas duas obras precedentes, "Pather Panchali" e "Aparajito".
O ator Chhabi Biswas, que representa o "zamindar" arruinado Huzur Biswambhar, tem uma comovente "performance", neste drama psicológico, sendo inesquecíveis os close-ups das suas expressões, reveladoras da profundidade das suas emoções. E Ray ficou tão devastado com a sua morte em 1962, que nunca mais retratou personagens masculinas maduras nos seus guiões.
Roy, outrora incontestável senhor da região é nestes tempos ultrapassado por um novo rico, sem sensibilidade e sem cultura e não passa então de uma caricatura de poder, apenas passando para os outros a imagem imutável de um trágico orgulho. E qual rei Lear, desperta em nós a mesma empatia, doravante a vertiginosa fuga à realidade. O seu último reduto é o magnificente salão de música e os dispendiosos concertos que nele patrocina.
O salão de música, com todo o luxo que ostenta, os retratos da linhagem aristocrática nas suas paredes, o candelabro e o enorme espelho que reflecte a pose orgulhosa do seu proprietário, é ele próprio uma extensão física e espiritual de Roy e um personagem animado que se exprime tanto pelo silêncio em contraste metafísico com a eloquente música das "soirées", como por transformações subtis, como oscilações no candelabro e variações de luminosidade que reflectem os humores e as expectativas do seu dono.
O ator Chhabi Biswas, que representa o "zamindar" arruinado Huzur Biswambhar, tem uma comovente "performance", neste drama psicológico, sendo inesquecíveis os close-ups das suas expressões, reveladoras da profundidade das suas emoções. E Ray ficou tão devastado com a sua morte em 1962, que nunca mais retratou personagens masculinas maduras nos seus guiões.
Roy, outrora incontestável senhor da região é nestes tempos ultrapassado por um novo rico, sem sensibilidade e sem cultura e não passa então de uma caricatura de poder, apenas passando para os outros a imagem imutável de um trágico orgulho. E qual rei Lear, desperta em nós a mesma empatia, doravante a vertiginosa fuga à realidade. O seu último reduto é o magnificente salão de música e os dispendiosos concertos que nele patrocina.
O salão de música, com todo o luxo que ostenta, os retratos da linhagem aristocrática nas suas paredes, o candelabro e o enorme espelho que reflecte a pose orgulhosa do seu proprietário, é ele próprio uma extensão física e espiritual de Roy e um personagem animado que se exprime tanto pelo silêncio em contraste metafísico com a eloquente música das "soirées", como por transformações subtis, como oscilações no candelabro e variações de luminosidade que reflectem os humores e as expectativas do seu dono.
Por tudo isto, as sequências dos concertos são um bálsamo para os sentidos.
Mas este filme é sobretudo um fascinante retrato psicológico, de um homem na terceira idade da vida, que tudo teve e tudo perdeu, menos o seu espírito indomável que nele sobrevive. Estamos perante uma imponente obra de arte, um legado impressionante de beleza e espírito.
Tive a sorte de dispor de informação acerca deste realizador indiano e vi os filmes que são objeto de analise.Dificilmente acreditarei que foram feitos por uma pessoa inexperiente tal é o grau de dificuldade que o filme encerra como realização e tal é o grau de perfeição formal que apresental.Se pensarmos que estavamos na Índia rural dos cinquenta entâo o espanto é muito.Aconselho todas as pessoas a que procurem e vejam estes filmes que fazem pate do patrimonio artístico da humanidade.
ResponderEliminarVer este filmes e falar sobre eles faz lembrar uma questão que tem servido de reflexão aos pensadores do cinema e que é.Porque falamos estes e não outros?Mesmo que falemos mal.Não estamos a falar dos media que nos "metem" pelos olhos dentro os produtos culturais.Estamos a falar das obras que suscitam uma reação.Há quem pense que essas obras se suscitam é porque tem em si "aquilo" que falta a outras.Depois o tempo dirá se era apenas "bagunça" ou arte.Creio não errar se afirmar que estes filmes estão dentro dessa categoria.Arte.