"Vérités et mensonges" - Título original.
"F for Fake" - Título em inglês.
"F de fraude" / "Verdades e mentiras" - Título em Portugal/Brasil.
Origem: França, Irão, RFA. Ano:1973.
Linguagem: Inglês, Francês e Espanhol.
De: Orson Welles (Realização e argumento).
Com: Orson Welles, Oja Kodar, Joseph Cotten, Helmyr de Hory, Clifford Irving, Laurence Harvey, François Reichenbach.
Cinematografia: François Reichenbach.
Música: Michel Legrand.
Género: Falso documentário/Ensaio cinéfilo. 89 minutos. Cor.
Género: Falso documentário/Ensaio cinéfilo. 89 minutos. Cor.
Sinopse
Um documentário/ensaio, sobre fraude e falsificação.
"F de farsantes", em português, exprimiria melhor as ideias que perpassam por este filme e para todos os efeitos é o meu título. A fraude e os seus autores, nem sempre se revestem da necessária encenação e em regra, trocam as imprescindíveis popularidade e assinatura, que os farsantes gostam de ostentar como cartão de visita, por um mais conveniente anonimato. Um simples indivíduo que cometa fraude é mais um criminoso que acaba quase sempre por ir parar atrás das grades, enquanto um farsante, a sua fraude ou é completamente irrelevante (a maioria), ou é uma verdadeira obra de arte e ele próprio um génio, a quem espera um panteão à altura da sua glória.
Vi este filme, movido por um daqueles "tags" ou "links" que fazem a delícia (e não raras vezes o desespero) de qualquer intercinenauta (direito de autor a partir deste momento! ) que se preze e que procure o máximo de informação, neste caso, tendo como ponto de partida o filme de Abbas Kiorastami, "Cópia Certificada", revisto neste blog recentemente, com quem este filme de Welles foi logo aparentado por rigorosas, frias e impersonalizadas bases de dados. Se se recordam desse filme do celebrado iraniano, rodado em Itália, a grande premissa era que "esqueçam o original e arranjem uma boa cópia" e mais: a cópia era enaltecida porque possibilitaria uma melhor compreensão da obra original.
Aliás, o próprio Pablo Picasso, teria dito, a certa altura, algo do género: "a arte é uma mentira, que nos possibilita conhecer a verdade".
Este filme não é um documentário, porque faz questão de misturar o real com a ficção, constituindo mais um ensaio, apresentado por meios audiovisuais, do que outra coisa. O próprio realizador e narrador, para além de se apresentar como um refinado farsante, ostentando a necessária prova e a pose provocadora e manipuladora - aquela postura no estúdio, sugerindo as possíveis diatribes com as fitas, não engana - resolve brincar com ideias à priori sedimentadas e indiscutíveis, para não dizer tabus, abrindo e expondo sibilinamente ao debate, os conceitos de arte, autenticidade, especialista e falsificação.
Eis-nos, portanto, guiados pelo génio indiscutível deste corpulento americano, que aos 26 anos nos brindou com uma obra perene, a sua fulgurante película de estreia, " Citizen Kane" ("O mundo a seus pés") (1941) e que anos antes, dera já um ar da sua graça, de brincalhão e farsolas, com a "Guerra dos mundos" (1938), essa farsa radiofónica demolidora sobre os nossos medos de contornos apocaliticos. O enorme crédito que Orson ganhou com essas obras, possibilitou-o a dizer e a fazer literalmente tudo, sem que se desfizesse a habitual reverência do mundo cinéfilo. Orson é definitivamente especial, um caso à parte de talento e carisma, no cinema e na vida. E para que não restassem dúvidas, ela a bela Croata Oja lá estava como selo de qualidade, pois em terra de cegos quem tem (tinha) uma Oja é (era) rei !
Mas voltando ao filme e à sua discussão principal, sobre o original e a cópia, a mentira e os seus frutos, a fraude e os seus dividendos (repare-se: nunca o crime e o castigo, porque Dostoiévski não entra neste filme e aqui reina a bonomia e o humor, politicamente corretos), Orson começa por mostrar os seus dotes de prestidigitador, que logo nos centra no essencial: embora este filme suscite uma discussão séria, não passa de um filme e portanto de uma ilusão. Porque, como nos tratou logo de avisar o seu realizador: "Um ator é basicamente um farsante" e " quase todos os filmes são sobre alguma forma de mentira". Portanto não nos iludamos quanto ao carácter documental da coisa, até porque para lançar mais confusão, o farsante Orson avisou que o filme seria honesto e verdadeiro até quase ao final, onde entraria então um pouco de ficção...Bem, em Orson, tudo é para levar a sério, mesmo a brincadeira...
Em suma, estamos perante um filme que nos faz sorrir e pensar. É fascinante conhecer um pouco os farsantes deste filme, desde o impagável Elmyr de Hory até ao capcioso Clifford Irving, este curiosamente "apanhado" na sua falsa autobiografia de Howard Hughes, uns meses antes da rodagem deste filme - que na verdade foi mais um aproveitamento de alguma "footage" adquirida pelo cimematografista François Reichenbach, por outras razões, como a maroteira dos apanhados no "passeio" da escultural à época, Oja Kodar - e que se revelou portanto providencial e inesquecível: um farsante (Elmyr de Hory) visto por outro (Clifford Irving) e vice-versa !
Já na parte final, no préviamente avisado conteúdo de pura fantasia, Picasso tem uma "aparição", na forma de um aparente "affair" artístico com Oja, da qual resultariam 22 quadros de excelsa arte erótica, pintados pelo "pincel viril" do espanhol e posteriormente "sorripiados" por Oja e copiados "genialmente" pelo avó da dita cuja, um obscuro hungaro às portas da morte e suscitando mais umas quantas inquietações sobre a arte ela própria, na deliciosa discussão, entre o artista e o seu falsário, na encenação protagonizada por Orson e Oja. Teria dito o moribundo húngaro, ser não um , mas múltiplos artistas, de Rembrandt a Picasso, habitando como um espectro as paredes de múltiplos museus por esse mundo fora e que agora ao morrer precisava de acreditar que a arte era real. E instado por Pablo a desvendar o destino dos quadros originais roubados por Oja do seu espólio, teria dito que foram queimados !
Exatamente como Elmyr, o farsante mais notório, mostra repetidamente no filme, ao queimar as suas "originais" cópias, de uma forma um tanto ou quanto teatral, ou não estivéssemos perante um verdadeiro mestre da farsa...
Vi este filme, movido por um daqueles "tags" ou "links" que fazem a delícia (e não raras vezes o desespero) de qualquer intercinenauta (direito de autor a partir deste momento! ) que se preze e que procure o máximo de informação, neste caso, tendo como ponto de partida o filme de Abbas Kiorastami, "Cópia Certificada", revisto neste blog recentemente, com quem este filme de Welles foi logo aparentado por rigorosas, frias e impersonalizadas bases de dados. Se se recordam desse filme do celebrado iraniano, rodado em Itália, a grande premissa era que "esqueçam o original e arranjem uma boa cópia" e mais: a cópia era enaltecida porque possibilitaria uma melhor compreensão da obra original.
Aliás, o próprio Pablo Picasso, teria dito, a certa altura, algo do género: "a arte é uma mentira, que nos possibilita conhecer a verdade".
Este filme não é um documentário, porque faz questão de misturar o real com a ficção, constituindo mais um ensaio, apresentado por meios audiovisuais, do que outra coisa. O próprio realizador e narrador, para além de se apresentar como um refinado farsante, ostentando a necessária prova e a pose provocadora e manipuladora - aquela postura no estúdio, sugerindo as possíveis diatribes com as fitas, não engana - resolve brincar com ideias à priori sedimentadas e indiscutíveis, para não dizer tabus, abrindo e expondo sibilinamente ao debate, os conceitos de arte, autenticidade, especialista e falsificação.
Eis-nos, portanto, guiados pelo génio indiscutível deste corpulento americano, que aos 26 anos nos brindou com uma obra perene, a sua fulgurante película de estreia, " Citizen Kane" ("O mundo a seus pés") (1941) e que anos antes, dera já um ar da sua graça, de brincalhão e farsolas, com a "Guerra dos mundos" (1938), essa farsa radiofónica demolidora sobre os nossos medos de contornos apocaliticos. O enorme crédito que Orson ganhou com essas obras, possibilitou-o a dizer e a fazer literalmente tudo, sem que se desfizesse a habitual reverência do mundo cinéfilo. Orson é definitivamente especial, um caso à parte de talento e carisma, no cinema e na vida. E para que não restassem dúvidas, ela a bela Croata Oja lá estava como selo de qualidade, pois em terra de cegos quem tem (tinha) uma Oja é (era) rei !
Mas voltando ao filme e à sua discussão principal, sobre o original e a cópia, a mentira e os seus frutos, a fraude e os seus dividendos (repare-se: nunca o crime e o castigo, porque Dostoiévski não entra neste filme e aqui reina a bonomia e o humor, politicamente corretos), Orson começa por mostrar os seus dotes de prestidigitador, que logo nos centra no essencial: embora este filme suscite uma discussão séria, não passa de um filme e portanto de uma ilusão. Porque, como nos tratou logo de avisar o seu realizador: "Um ator é basicamente um farsante" e " quase todos os filmes são sobre alguma forma de mentira". Portanto não nos iludamos quanto ao carácter documental da coisa, até porque para lançar mais confusão, o farsante Orson avisou que o filme seria honesto e verdadeiro até quase ao final, onde entraria então um pouco de ficção...Bem, em Orson, tudo é para levar a sério, mesmo a brincadeira...
Em suma, estamos perante um filme que nos faz sorrir e pensar. É fascinante conhecer um pouco os farsantes deste filme, desde o impagável Elmyr de Hory até ao capcioso Clifford Irving, este curiosamente "apanhado" na sua falsa autobiografia de Howard Hughes, uns meses antes da rodagem deste filme - que na verdade foi mais um aproveitamento de alguma "footage" adquirida pelo cimematografista François Reichenbach, por outras razões, como a maroteira dos apanhados no "passeio" da escultural à época, Oja Kodar - e que se revelou portanto providencial e inesquecível: um farsante (Elmyr de Hory) visto por outro (Clifford Irving) e vice-versa !
Já na parte final, no préviamente avisado conteúdo de pura fantasia, Picasso tem uma "aparição", na forma de um aparente "affair" artístico com Oja, da qual resultariam 22 quadros de excelsa arte erótica, pintados pelo "pincel viril" do espanhol e posteriormente "sorripiados" por Oja e copiados "genialmente" pelo avó da dita cuja, um obscuro hungaro às portas da morte e suscitando mais umas quantas inquietações sobre a arte ela própria, na deliciosa discussão, entre o artista e o seu falsário, na encenação protagonizada por Orson e Oja. Teria dito o moribundo húngaro, ser não um , mas múltiplos artistas, de Rembrandt a Picasso, habitando como um espectro as paredes de múltiplos museus por esse mundo fora e que agora ao morrer precisava de acreditar que a arte era real. E instado por Pablo a desvendar o destino dos quadros originais roubados por Oja do seu espólio, teria dito que foram queimados !
Exatamente como Elmyr, o farsante mais notório, mostra repetidamente no filme, ao queimar as suas "originais" cópias, de uma forma um tanto ou quanto teatral, ou não estivéssemos perante um verdadeiro mestre da farsa...
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